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É no concurso que eu vou
Se você acha que emprego público é sinônimo de estagnação profissional, pense novamente. Muitas empresas estatais têm aumentado os salários dos profissionais de TI e criado oportunidades de ascensão na carreira. A boa e velha estabilidade no emprego continua presente em muitas delas. E as jornadas de trabalho no setor público costumam ser menos estressantes que na iniciativa privada. Esses atrativos têm levado dezenas de milhares de pessoas a prestar concursos públicos todos os anos, um número que não para de aumentar.
A Dataprev, empresa de TI da Previdência Social, por exemplo, encerrou inscrições em abril para seu próximo concurso. Nada menos que 21 886 pessoas se inscreveram para formar uma reserva com 1 135 vagas. O volume é 85% maior do que o do último concurso, realizado em 2008. Rodrigo Assumpção, presidente da Dataprev, diz que muitas empresas estatais têm funcionários com faixa etária elevada. Elas buscam pessoas para reposição ou preenchimento de novas vagas. “Estamos num momento de transição”, diz.
Desde 2006 a Dataprev realiza concursos a cada dois anos. Segundo Assumpção, para atrair bons profissionais, uma das armas é a remuneração, que dobrou desde 2006. Há quatro anos, um analista assumia o cargo ganhando 2 018 reais por mês. Agora, ele deve começar com 4 288 reais. Também está em implantação um bônus para quem atingir as metas.
O Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro) é outra estatal que aumentou a remuneração dos analistas. “Em 2008, elevamos os salários em 57%”, afirma Maria Helena Aires Coelho Machado, gerente de gestão e avaliação de carreiras do Serpro. Além disso, a gratificação de especialização, que compõe a remuneração, cresceu 8%. Hoje, a remuneração inicial de um profissional com jornada de 40 horas semanais é de 4 374 reais. Desde 2004, o Serpro já realizou cinco processos seletivos. Entre os profissionais procurados estão os de desenvolvimento de sistemas e suporte técnico. Há vagas também para administradores de serviços e analistas de negócios com conhecimento em TI.
No Serpro, o profissional pode conquistar novos cargos por mérito ou tempo de serviço. Além disso, desde o ano passado, há avaliações anuais de desempenho. Ou seja, empresas estatais, cada vez mais, incorporam métodos similares aos da iniciativa privada para desenvolver seus profissionais. Por isso, elas vêm atraindo pessoas que, apesar de estarem numa estatal, querem continuar competitivas no mercado.
Plano de carreira
Um exemplo é a carioca Sarah Gerhard, de 29 anos. Tecnóloga em informática, ela prestou concurso para o cargo de analista na Dataprev de Fortaleza, em 2006, mesmo sabendo que seu salário seria reduzido a um terço do que ganhava. Sarah, que era funcionária terceirizada do Ministério do Desenvolvimento Social, em Brasília, buscava estabilidade no emprego e proximidade da família, que morava na capital cearense. “Eu ganhava quase 6 000 reais, mas estava sozinha e não tinha certeza de ter emprego no dia seguinte”, afirma. Para se preparar, Sarah estudou por conta própria, usando apostilas e provas de concursos anteriores. Quando percebia que estava fraca em algumas matérias, cursava apenas essas disciplinas, uma por vez, num curso preparatório de Brasília. O esforço foi recompensado. No fi m de 2006, Sarah voltou a morar perto da família e ganhou estabilidade. “Apesar de a Dataprev trabalhar em regime de CLT, as demissões são pouco frequentes e precisam ser bem justificadas”, diz.
Em 2007, Sarah assumiu a gestão de um projeto da Secretaria de Previdência Complementar. Por conta própria, ela começou, então, um MBA em gerenciamento de projetos na Fundação Getúlio Vargas (FGV). Um ano depois, assumiu a gerência da unidade cearense. Em 2008, foi promovida a gerente da Unidade de Desenvolvimento de Software do Ceará da Dataprev. “Ganhei visibilidade por ter postura questionadora, habilidade de comunicação e de liderança”, diz. A remuneração triplicou. “Agora, cheguei mais ou menos ao que ganhava em Brasília,” diz. A unidade gerenciada por Sarah tem 150 pessoas que desenvolvem sites na web para o governo. Paralelamente, ela continua estudando. “Se, em algum momento, meu objetivo não estiver alinhado ao da empresa, vou para outro lugar”, diz.
Crescimento acelerado
O mineiro Ivan Dornela Goulart, de 32 anos, superintendente de operações do Serpro, em Brasília, também não para de se atualizar. O tecnólogo em processamento de dados foi admitido no concurso realizado em 2004, como analista de redes em Belo Horizonte. "Sempre gostei de aprender sozinho e isso me ajudou", afirma. Ele já tem duas pós-graduações, uma em gestão estratégica da informação e outra em redes de telecomunicações, ambas pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Goulart trocou um emprego de dez anos numa pequena empresa familiar por um cargo estatal. Para isso, pesou a redução da jornada de trabalho. “Eu trabalhava 10 horas por dia, inclusive nos finais de semana, e mal tinha tempo para almoçar”, conta. Na troca, seu salário seria reduzido em um terço. Goulart achou que valeria a pena.
Em 2007, ele se tornou gerente de rede de longa distância em Minas Gerais. Em 2009, assumiu a superintendência de operações, em Brasília. Em cinco anos, sua remuneração aumentou sete vezes, chegando a 13 000 reais. Hoje, sua jornada de trabalho ultrapassa as 40 horas semanais, mas ele vê esse período como fase de adaptação. “Minha meta é voltar a trabalhar 8 horas por dia”, diz. Para Goulart, as características que facilitaram seu crescimento foram conhecimento técnico, habilidade de negociação e facilidade em lidar com pessoas.
Elias Mussi, de 34 anos, gerente do Centro de Processamento de São Paulo da Dataprev, é outro profissional que teve crescimento acelerado na estatal. Mussi é engenheiro mecânico com mestrado em engenharia de produção. Era funcionário terceirizado da Dataprev quando decidiu prestar um concurso da empresa, em 2008. Aprovado em oitavo lugar, ocupou uma vaga de analista de produção no início de 2010, em Brasília. Pouco depois, assumiu a unidade paulista da empresa e viu sua remuneração mais que dobrar. Hoje, Mussi ganha cerca de 9 000 reais. Para ele, saber lidar com pessoas é essencial, principalmente numa estatal. “A faixa etária aqui é alta, principalmente em processamento”, diz. “Para impor um ritmo novo e alcançar resultados, é preciso ter postura política e fazer com que as pessoas caminhem com você”, afirma. Mussi observa que, embora a experiência profissional não conte pontos no concurso, ela abre portas para quem ingressa na empresa e pretende se desenvolver.
Info, Fernanda Bottoni, 10 de junho de 2010