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"Brasil possui imunidade natural aos recentes problemas do OpenOffice"
No último mês, quando a OpenOffice.org comemorava dez anos, a comunidade internacional de software livre foi surpreendida com a aquisição da Sun Mycrosystem pela Oracle. Com a compra da empresa responsável pelo projeto, houve um rompimento que teve como pivô a criação da "The Documento Foundation", uma fundação independente que desenvolve um novo projeto: o LibreOffice. Na entrevista abaixo, Luis Claudio Filho, presidente da BrOffice, discute o futuro das suítes de escritório em código aberto.
Quais os principais motivos que levaram os desenvolvedores do Open Office a se desvincularem da Oracle?
Na verdade, o modelo de desenvolvimento sob o guarda-chuva de uma empresa sempre foi algo preocupante, pois são os interesses corporativos que prevalecem. Assim, o que não é estratégico para determinado modelo de negócio acaba sendo "vetado". Esse modelo é aplicado a uma série de outros softwares com o selo de "community" ou "enterprise". O primeiro agrega o que é genérico e estabiliza o produto. O segundo é focado ao mercado, que "paga" pela solução.
Essa abordagem, quando aplicada ao universo do OpenOffice.org, torna-se preocupante. Isso porque temos centenas de desenvolvedores, voluntários ou funcionários de empresas, querendo contribuir para o código e sofrendo limitações. No caso da Sun, a empresa vinha com uma política muito interessante de compartilhamento, já inserida no ecossistema do software livre. Já a Oracle, na minha opinião, tem uma visão diferente, focada nos produtos e não na comunidade. Se antes tínhamos limitações no processo de desenvolvimento, a tendência será ter mais restrições ainda, com a consequente debandada da força voluntária do projeto. Isto impacta diretamente o desenvolvimento e a evolução do produto.
O que muda para o usuário comum? Uma empresa como o Serpro poderá perceber, mesmo a longo prazo, algum tipo de alteração?
No caso do Brasil, temos uma espécie de imunidade natural a esse problema. Ironicamente, devido a uma questão de marcas que ocorreu aqui e na Holanda (sendo que, lá, esse quadro foi revertido), houve a necessidade de trocar o nome do produto e comunidade, passando de OpenOffice.org para BrOffice.org.
Como o Serpro e a esmagadora maioria do mercado usa o BrOffice.org e não o OpenOffice.org, essa questão acaba se tornando transparente para o usuário. O projeto no país continua, juntamente com o produto.
Qual a posição oficial da comunidade BrOffice em relação à questão?
O BrOffice.org está alinhado ao "The Document Foundation", fundação criada pela comunidade para manter a divergência do projeto OpenOffice.org, que manterá o produto "LibreOffice". No país, continuaremos com o nome "BrOffice". Continuamos, também, a ser a comunidade brasileira do projeto internacional.
O rompimento causa algum prejuízo ao BrOffice?
Houve um rompimento formal da comunidade brasileira em relação ao OpenOffice.org. Apesar de soar ruim e apesar de que divergências dentro de qualquer projeto sempre acarretam algumas perdas, temos pontos extremamente positivos como a mudança da governança do projeto, o que permite um aumento da participação.
O problema com add-ons não-livres foi resolvido? Quais outras questões deverão ainda ser superadas?
A arquitetura do BrOffice é extremamente flexível, permitindo, ao usuário, escolher o que vai utilizar ou não. O fato de termos extensões não-livres, porém gratuitas, não prejudica o usuário final. Por outro lado, com a liberdade de evoluir aplicações com maior independência, é questão de tempo para termos contribuições que substituam as partes consideradas estratégicas para licenças livres.
Quais as inovações e esperanças trazidas pela criação da "The Document Foundation"?
O principal ponto é a desvinculação do processo de desenvolvimento de interesses empresariais. Com a TDF, teremos uma maior atuação de voluntários, empresas e ONGs (como a própria BrOffice.org - Projeto Brasil) contribuindo com códigos para o produto.
Quais as questões ainda pendentes?
Atualmente estamos estruturando o novo ambiente do projeto. São dezenas de serviços como qualidade, wiki, listas, controle de versionamento, entre tantos outros, que precisam ser criados e disponibilizados. E a OSCIP BrOffice.org está apoiando todos esses processos com recursos.
Como tem sido a reação da comunidade de software livre em relação à criação da TDF?
Tem sido positiva e vista como uma evolução, uma maturação das comunidades de software livre. Garantir a existência desses "softwares de base", isto é, aqueles comuns a todos os usuários de todas as áreas do conhecimento (como escritório, internet, sistema operacional) desvinculados de interesses de lucro é fundamental. Isso traz inovações e melhorias no atendimento das demandas de quem mais precisa: o usuário final.
Comunicação Social do Serpro - Brasília - 21 de outubro de 2010